A educação é essencial ao desenvolvimento econômico, e profissionais que não sabem ensinar prejudicam os alunos. A tese é de Eric Hanushek, professor da Universidade Stanford e doutor em economia pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos. ´O bom professor é aquele com quem os alunos aprendem e isso independe de titulação ou remuneração´, afirma o autor de pesquisas que contribuem para o redirecionamento de políticas públicas educacionais
O senhor é apontado como autor da mais extensa pesquisa já feita sobre os efeitos de um bom ensino no crescimento econômico. Os governantes têm a devida compreensão do impacto da educação na economia?
Praticamente no mundo inteiro há o reconhecimento de que em que a educação é elemento essencial para o desenvolvimento das pessoas. Muitos, contudo, não entendem bem qual o impacto da educação na desenvolvimento econômico de um país. Também não entendem que mais importante que o tempo de permanência na escola é o que os alunos estão aprendendo.
Como dimensionar os impactos produzidos na economia pelo processo educacional?
A melhor preparação dos alunos permite que eles cheguem mais capazes e competitivos ao mercado de trabalho. Se o governo der início hoje a uma política pública de melhoria da qualidade da educação, os impactos serão sentidos em pouco anos, quando os estudantes se transformarem em mão-de-obra ativa.
Sobre isso, o que apontam suas pesquisas?
Nos últimos 20 anos, os economistas tentaram entender por que alguns países crescem mais que outros. E o primeiro fator a ser considerado é a formação da mão-de-obra, ou seja, o capital humano, que pode ser medido pelas habilidades e conhecimentos de cada um. Nosso cálculo é de que se o investimento tiver sido feito em 2005, o PIB do país estará 10% mais alto que o atual em 2025. Isso significa que os ganhos do Produto Interno Bruto compensariam todos os gastos com o ensino público.
Em suas publicações, o senhor observa que apesar de o gasto por aluno no território americano ser maior que na Europa, isso não impacta diretamente na qualidade do ensino. O que seria, então, fundamental ao processo de aprendizagem?
A educação é a chave para o desenvolvimento econômico, mas profissionais que não sabem ensinar atrasam a vida de alunos em todos os países. O bom professor é o elemento essencial ao bom aprendizado.
Que parâmetros poderíamos utilizar para conceituar um bom professor?
O bom professor é aquele com quem os alunos aprendem. E esse profissional é tão importante que é capaz de minimizar as diferenças entre uma criança de família rica e outra menos favorecida socialmente.
E qual é a forma de identificar os melhores profissionais?
Não há formação acadêmica nem diploma que garantam que alguém está apto a ser bom professor. Não há relação direta entre ter mestrado ou doutorado com o aprendizado dos estudantes. Somente a prática é capaz de revelar a aptidão para o magistério. É fundamental que o poder público possa demitir quem não dá conta do recado.
Como fazer isso?
Uma das opções para resolver o problema seria adotar contratos de experiência por cinco anos. Depois, profissionais com fraco desempenho seriam dispensados, como acontece em outras profissões. Outra saída é a aposentadoria compulsória. O que não se deve permitir é que maus professores dificultem o processo de aprendizagem. Pode até não ser agradável, contudo em certos casos, é melhor pagar professores para não estarem na sala de aula, já que estão fazendo mal a nossas crianças.
Qualificação e o tempo de estudo não contam?
É preciso investir mesmo na qualificação dos bons profissionais. Nenhuma política é mais eficiente do que a identificação e gratificação dos professores eficientes, daqueles que são capazes de estimular nos alunos o gosto pelo estudo e de repassar o conhecimento. É preciso haver uma política de premiação dos talentosos. É necessário uma remuneração por desempenho.
E de substituição?
Se houvesse apenas uma política de substituir os maus pelo professor mediano ainda assim haveria uma grande repercussão para as crianças. Nos Estados Unidos, todos sabem na escola quem são os maus professores: os diretores, os outros professores, os alunos, até o pessoal da limpeza sabe. Porém, há uma resistência às mudanças. As medidas pensadas para a educação incluem currículo, reforma no prédio da escola (...), nenhuma chega perto de mexer na força de trabalho do professor. E isso acontece também no Brasil e no resto do mundo. Independentemente da luta por isonomia dos sindicatos, o correto é adotar um programa de identificação e, depois, de manutenção dos bons. E com certeza a eficácia dos professores em sala de aula é a chave para o problema da aprendizagem infantil.
No Ceará, o governo do Estado já anunciou, em meados deste mês, que as notas dos alunos irão interferir na remuneração dos professores. Ou seja, esse projeto se coaduna com tese que o senhor defende. Mas como evitar que professores aumentem as notas ou aprovem alunos para ser beneficiados?
Para evitar esse risco, poderia haver um julgamento externo das notas dos alunos. Na verdade, o desempenho de todos numa escola deve ser verificado, até mesmo o do diretor. Nos Estados Unidos, os professores são avaliados também pelo absenteísmo. É preciso pensar todas as formas de fazer o ensino ser mais eficiente.
Mas o que pode fazer um professor eficaz por uma criança pobre, com pais analfabetos e sem acesso à leitura?
Um bom professor durante três ou quatro anos na vida de uma criança pode compensar as desvantagens que sofre um aluno que vem de uma família em condições socioeconômicas inferiores. Pesquisas comprovam isso.
Que conclusões podemos tirar da análise dos últimos resultados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa)?
Nos Estados Unidos, podemos concluir que a substituição de 10% dos piores professores elevaria a nota média do país em quase 50 pontos na prova de Ciências. No caso brasileiro, acredito que a substituição faria o país encostar em Portugal, subindo da 52 ª posição para a 37ª ano Pisa.
Qual a importância do aumento do acesso à escola pública como indicador de melhoria no ensino?
Nem sempre o aumento do número de crianças na escola significa que a educação de um país esteja melhorando. Uma das comprovações disso é o fraco desempenho do Brasil nas avaliações internacionais, como o Pisa. No último ranking, o Brasil ocupou o 48º lugar (entre 57 países) em Leitura; 53º lugar em Matemática (entre 56); e 52º lugar em Ciências, dentre todos os participantes. E essa foi uma das piores classificações da lista.
Apesar de as inteligências múltiplas já serem reconhecidas, inclusive a interpessoal e a intrapessoal, no Ceará e em outros estados as escolas não demonstram grandes preocupações com a educação emocional de seus alunos. Qual a opinião do senhor sobre isso?
Considero que as pessoas devam ser educadas emocionalmente e que tenham suas diferentes habilidades e competências reconhecidas e estimuladas. Todavia o mais importante é garantir as suas necessidades básicas de formação e de conhecimentos.
Mudando um pouco de assunto, eu gostaria de saber a respeito do reforço escolar. Alguns educadores apontam o risco de vir a ser uma muleta para o estudante, que poderia não prestar a devida atenção ao que é ministrado em sala de aula confiante no reforço que teria posteriormente. Concorda?
Alguns pais possuem poder aquisitivo suficiente para oferecer reforço escolar para seus filhos, mas outros não. Então, ou deveríamos garantir aos pais que não podem condições de arcar com o reforço escolar de seus filhos ou, melhor ainda, seria o governo possibilitar para todas as crianças oportunidades de um aprendizagem.
O que pensa sobre o ensino a distância, em crescimento no mundo e também no Brasil?
As pessoas argumentam que as novas tecnologias são boas ou que responderão a muitos problemas. Hoje, nos Estados Unidos em quase todas as casas há um computador. Mas é preciso lembrar que não existe um curso que seja ministrado inteiramente à distância. A educação é uma cadeia, que envolve decisões sobre currículo, preparação das aulas e o contato, em maior ou menor escala, do professor com os alunos.
Levando em consideração que os investimentos em educação trazem mais retorno em médio ou longo prazos, como fazer para evitar que a educação não seja atrelada aos interesses políticos, que são de curto prazo?
Não se sabe. A política e as práticas costumam estar atreladas. Eu tinha um amigo que dizia ser melhor primeiro tentar mudar os políticos (risos). Bem, uma saída seria divulgar as práticas, mostrar o que se faz nas escolas, os investimentos em educação e em capital humano.
Qual o papel dos pais na educação infantil?
É enorme. Pais com mais educação formal podem de várias maneiras estimular a aprendizagem dos filhos. Mas nos Estados Unidos, assim como em outros países, o governo não quer interferir nas famílias, não quer dizer como elas devem viver. Por isso, prestam mais atenção na escola e no professor.
MOZARLY ALMEIDA
Repórter
FIQUE POR DENTRO
Pesquisador é um dos mais influentes nos EUA
O professor e pesquisador norte-americano Eric Hanushek foi o convidado internacional do Seminário Educação e Desenvolvimento, promovido pela Fundação Itaú Social no Museu da Escultura na cidade de São Paulo (SP), no último dia 24.
Integrante de algumas comissões de educação de alto nível no estado da Califórnia, o palestrante é autor de diversos livros, entre eles ´´A Reforma no Sistema de Educação Pública´´. Hanushek também é hoje um dos mais influentes estudiosos do impacto do investimento em Educação no desenvolvimento econômico de um país.
Participaram do seminário ainda Maria Helena Castro, professora da Unicamp; Naércio de Menezes Filhos, da USP; e Ricardo Paes de Barros, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O Diário do Nordeste foi o único jornal cearense a cobrir o evento.
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